terça-feira, 4 de maio de 2010

A paineira

Foto: Bernardo Bortolotto

Da minha janela vejo prédios, antenas, chaminés, para raios e um pouco do céu. Do outro lado da rua, uma peculiaridade. Uma paineira cresceu enormemente, cinco andares de um prédio. Seus galhos encobrem sacadas, portas e janelas. Também são suítes residências dos pardais, pombas e outros pássaros que por aqui transitam.

Da minha janela ouço os primeiros pingos de chuva a cair. O barulho aumenta e a água já escorre pela sarjeta. Até o som dos pneus dos carros que deslizam sobre o asfalto molhado estão diferentes. Mas, logo a chuva para. Já ouço as aves cantando novamente.

A paineira está encharcada. O tronco gigante parece seco, imponente. Realmente intocável. Caule coberto por espinhos espanta qualquer ser humano que tente escalar suas ramificações. Aliás, está coberta por frutos verdes semelhantes ao abacate, porém não são de comer.

São parecidos com frutas na forma e casulos na maneira como se desenvolvem. Logo verei a paina saindo destas cápsulas. A fibra fina e sedosa vista em travesseiros e ursos de pelúcia. Então, saberei que está na hora de fechar a janela.

O vento vai soprar a pluma sedosa branca que vai invadir as residências. É a natureza e o urbano juntos. A convergência desleal. A paineira aspira nossa poluição e nos devolve flores e a sutileza da paina branquinha.

As painas leves e livres de suas cápsulas vão ornamentar a rua e avisar que mais um inverno se aproxima. E este não é como o outono de chuvas passageiras e temperaturas amenas. É a estação fria, chuvosa, tempestuosa e escura do ano. Dos trovões que sacodem os prédios mais altos e tremem o vidro da minha janela.

Assim já poderei fechar as persianas e me amontoar nas cobertas. Estarei protegido. Pobre paineira que ficará exposta ao tempo. Os galhos não ficarão vazios não, porque está na hora de aninhar os pássaros.

Ai, ai, inverno anunciado pelo branco da árvore seja breve e não provoque estragos. Lave nossa terra e recarregue todas as energias. Enquanto isto, vou esperar ansioso na minha cápsula a chegada da primavera que trará novas flores à velha árvore. E os pássaros, novamente, cantarão e dançarão sobre o palco rosado da paineira. E eu, vou assistir de camarote.

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